Como VW melhorou o Voyage para ser o carro mais barato dos Estados Unidos
Após seis anos e testes até no Alasca, a Volkswagen no Brasil conseguiu exportar o melhor Voyage para Estados Unidos, Canadá e até para o Iraque
A Garagem VW, o acervo de carros históricos da Volkswagen do Brasil, dentro da fábrica da Anchieta, guarda algumas joias. Entre elas está duas unidades dos primeiríssimos Volkswagen Fox fabricados no Brasil: o Fox Sedan e o Fox Wagon, versões do Voyage e da Parati destinadas aos Estados Unidos e Canadá.
E a culpa é toda dos japoneses.
Desde meados da década de 1970 os carros japoneses começaram a ganhar o mercado norte-americano. Eram pequenos, mas também eram baratos e econômicos em plena Crise do Petróleo. Enquanto as fabricantes locais diminuíam a potência dos V8, os japoneses apostavam em motores pequenos e frugais.
A Volkswagen também viu isso como uma oportunidade. Por isso, desde o lançamento do VW Voyage no Brasil, em 1981, um grupo de executivos da Volkswagen se debruçou no secretíssimo “Projeto 99”: o plano era viabilizar a exportação de 100.000 carros para o mercado norte-americano.
Havia muito trabalho pela frente, não apenas pela qualidade dos carros brasileiros mas também pelas exigências bastante peculiares para a homologação de carros nos Estados Unidos – e algumas persistem até hoje.
Já em 1982, alguns Voyage foram despachados para teste no Alasca, a temperaturas de até 45 graus negativos. Nos cinco anos seguintes promoveram mais de 2.000 modificações nos projetos dos Voyage e Parati brasileiros só para a exportação. Ainda tiveram seus nomes mudados para Fox, com uma sonoridade melhor por lá do que um nome francês ou brasileiro.
O que o Voyage e a Parati Fox tinham de diferente?
Até mesmo a linha de produção precisara ser aprimorada só para os carros exportados. A Volkswagen chegou a importar 15 novos robôs para melhorar a qualidade das soldas por exigência do comprador externo.
O ano era 1987 e os Fox Sedan e Fox Wagon já tinham injeção eletrônica, item banido por aqui pela famigerada política de reserva de mercado da informática. Era uma injeção eletrônica burra: a Bosch KE-Jetronic tinha apenas um injetor e não tinha sonda lambda para corrigir seus parâmetros.
A tecnologia era aplicada no motor AP-800, o 1.8, e não aumentava a potência. Pelo contrário: rendia 81 cv e 12,8 kgfm contra 96 cv e 15,6 kgfm dos carros brasileiros, com carburador. O ganho estava nas emissões, que também eram ajudadas pelo catalisador – que só foi adotado no nosso Voyage em 1992.
O câmbio era sempre manual, com quatro marchas na maioria das versões e com cinco marchas na GL, com proposta mais esportiva. Nenhum tinha direção hidráulica.
Nos primeiros anos os carros de exportação tinham faróis selados e quadrados. Só em 1991 o VW Fox Sedan ganhou faróis com faróis mais estreitos similares aos usados no Brasil. Ainda tem luzes laranjas nos para-lamas traseiros e para-choques mais saltados, exigências dos EUA e do Canadá.
Os Fox e Fox Wagon ainda estrearam o quadro de instrumentos com comandos satélite, que podiam ser acionados sem tirar as mãos do volante. Esse painel só estreou no Brasil em 1988, nas versões mais caras do Voyage.
Enquanto o Fox Sedan era exportado com duas e quatro portas, o Fox Wagon só tinha duas portas – a Parati só ganharia opção quatro portas mais de 10 anos depois.
Foi um esforço de anos e que exigiu investimentos, mas o objetivo da Volkswagen foi alcaçado. O VW Fox foi lançado nos Estados Unidos por 5.200 dólares, segundo informações da época do jornal Automotive News. Era mais barato que os carros japoneses por lá comercializados e acabaria por assumir o posto que antes era do Fusca.
No fim de 1989, a revista americana Car and Driver comparou oito modelos mais baratos dos EUA. O VW Fox fez bonito e ficou em terceiro, atrás apenas de VW Golf e Honda Civic DX. Preço e qualidade ajudam a entender os 220.000 Fox que foram exportados até 1993 para os Estados Unidos.
Sucesso mesmo quem teve foi o Fox Sedan. Foram exportadas mais de 200.000 unidades do Voyage americano até o final de 1993. As exportações da Fox Wagon foram encerradas em 1989 com apenas 20.000 unidades produzidas.
As duas unidades que a Volkswagen mantém em seu acervo no Brasil foram usados para testes da Engenharia da fabricante. O sedã tem cerca de 10.000 km rodados, enquanto a perua rodou pouco mais de 3.000 km.
Outros destinos
O mesmo Volkswagen Fox chegou a ser exportado, quem diria, para o Iraque. Esse movimento migratório rumo ao Oriente Médio começou em 1988 e durou até 1990, quando teve início a Guerra do Golfo. Anos depois a Saveiro também foi enviada para países árabes em meados dos anos 1990.
Sem as melhorias exigidas pelos norte-americanos, o Volkswagen Voyage ainda foi exportado para alguns países vizinhos com outras identidades: Gacel ou Senda (Argentina) e Amazon (Peru, Chile e Guatemala).
O mais perto que o Brasil chegou de ter um Voyage parecido com o Fox foi o Voyage GLS, lançado em 1988 com motor AP-800 ainda carburado, mas com o mesmo painel com comandos satélite.
Até 1996, quando deixou de ser fabricada, a primeira geração do Voyage acompanhou as mudanças estéticas do Gol. Foram produzidos no total 856.471 Voyage da primeira geração e nada menos que 391.295 deles foram expatriados.