VW ID.4: o que amamos e odiamos no primeiro Volks elétrico do Brasil
Comercializado de maneira incomum, o Volkswagen ID.4 é um SUV médio com virtudes interessantes, mas que têm defeitos também. Qual o veredicto?
Para uma empresa gigantesca e que presta contas a acionistas, previsibilidade é uma dádiva. As fabricantes de carros sempre utilizaram isso ao seu favor, com décadas de expertise alimentando mudanças sempre graduais e bem pensadas (que mesmo assim davam errado de vez em quando).
Os carros elétricos mudaram tudo: de uma hora para outra, foi necessário investir bilhões em um nicho sem precedentes. Não é à toa que só uma companhia jovem, a Tesla, conseguiu relevância num dos tipos de comércio mais complicados e resistentes a mudanças no mundo. Ao mesmo tempo, montadoras tradicionais que se arriscavam primeiro erravam mais, e outras eram sábias ao observarem isso antes de agir.
Foi o caso da Volkswagen, que só em 2020 começou a vender veículos elétricos de nascença. A família ID. já nasceu evitando erros primários, como a adoção de um design muito disruptivo. A Volks soube aproveitar a modularidade da plataforma MEB e criar veículos distintos ao mesmo tempo que esteticamente agradáveis, que se relacionam com o legado da alemã e com mecânica adequada.
Dois deles chegaram ao Brasil: a já icônica ID.Buzz e o SUV ID.4, que testamos antes de sua comercialização. Com a conta na mesa, a percepção do produto muda; por isso, além do nosso teste clássicos, apresentamos cinco pontos positivos e cinco pontos negativos para você descobrir se é através dele a sua estreia no mundo eletrificado.
Pontos positivos
ESTILO Cada um tem seu gosto, mas o Volkswagen ID.4 muito provavelmente agradará quem curte o estilo da VW. Mesmo sem o emblema, o utilitário seria facilmente identificável como um carro da alemã, com elementos que conversam entre si de maneira análoga, por exemplo, a gerações distantes de um iPhone.
Formato de faróis e lanternas e para-choques, principalmente, são evoluções de modelos existentes no catálogo da marca. Tanto que novas versões de Tiguan ou Passat, entre outros, trazem estética vinda da família ID. Se em um carro a combustão tais escolhas já são naturais e bem aceitas, é sinal de que a marca soube criar um elétrico que não choca, mas evolui.
ESPAÇO Ele é só 10 cm maior do que um Toyota Corolla Cross, mas as referências de um SUV médio podem ser pouco úteis no Volkswagen ID.4, com seus 2,76 m de entre-eixos.
Os 543 litros de porta-malas são dignos de SUVs grandes, e o espaço traseiro é suficiente para três pessoas viajarem com conforto nos ombros e pernas, ajudadas pelo piso plano. Na dianteira, também há fartura espacial, com destaque para o console central ajustável que diminui uma eventual impressão de claustrofobia de outros modelos.
TECNOLOGIA Nem demais nem pouco. O pacote tecnológico do ID.4 é bem definido, atendendo ao que se espera em termos de conforto e segurança ao mesmo tempo que sua operação não é complexa.
Os faróis IQ.Light incrementam o estilo, mas servem, principalmente, para iluminar com força e amplitude o espaço à frente do carro. Além disso, os leds usam dados do GPS para ativar modos específicos a estradas rurais, rodovias e cidades, com farol alto que contorna o tráfego na contramão. As luzes tão se adaptam às curvas do trajeto.
Internamente, há Android Auto e Apple Carplay sem fio, carregador de celular por indução, ar-condicionado trizona, controle de cruzeiro adaptativo com assistente de permanência em faixa e frenagem autônoma de emergência. Os sete airbags são o principal item de segurança passiva.
O som do ID.4 é bom, e o recurso de estacionamento automático, que memoriza até cinco vagas usadas pelos donos no dia a dia, é melhor ainda. Mas essa última função destoa em termos de complexidade na operação, e é necessário algum esforço para entendê-la.
ESTRADEIRO As IQ.Lights e o ACC se juntam a outros detalhes, que tornam o Volkswagen ID.4 um carro bem confortável para pegar estrada. Nada importa tanto quanto a autonomia, que foi de 446 km (cidade)/354 km (estrada) em nosso teste padronizado, mas empiricamente pode ser um pouco mais.
Tanto que, no ciclo WLTP, o ID.4 tem autonomia de 522 km e até supera o Tiguan 2.0 que temos no Brasil, cujo tanque de 60 litros e consumo de 8,3 km/l (Inmetro) resultam em 498 km com um abastecimento.
O problema é que achar um eletroposto é muito mais difícil do que um posto de gasolina, mas se o cliente mora no Sudeste a situação fica mais fácil. Experimentamos conectar o ID.4 a uma tomada de 125 kW e o resultado foi bom, com 20 minutos adicionando 140 km de alcance e 40 min enchendo a bateria que estava em 32%.
Não é perfeito, mas está na média.
CONFORTÁVEL Acima da média é o conforto provido pela suspensão adaptativa e o isolamento acústico, que se destacam ainda mais nas avenidas urbanas, muitas vezes esburacadas. A calibração também é boa para buracos e lombadas, tendo o SUV se comportado bem onde semelhantes chacoalham e rolam de forma incômoda.
Junto aos bancos de ajuste elétrico fino e boa ergonomia, roda-se bastante sem cansaço. Pedais precisos seguem a mesma linha e os ocupantes traseiros, além do espaço, têm entradas USB-C próprias e ar-condicionado dedicado. É difícil apontar como tornar o ID.4 mais confortável sem incrementos complexos, dignos de Audi.
Pontos negativos
BOTÕES CONFUSOS Mas eles existem, é claro. E talvez sejam um dos poucos aspectos nos quais a VW foi moderninha demais.
O exemplo mais incômodo é o dos botões de baixo relevo, que misturam comandos de pressão leve, pressão mais pesada e deslizamento com os dedos para diversas funções.
Surgem situações engraçadas: se você está zapeando as músicas do Spotify, é comum manter o dedo sobre o botão de Next no volante, pressionando-o caso queira mudar de faixa novamente. No ID.4, o dedo em repouso age como fast forward, avançando a mesma faixa. Para zapear, é preciso pressionar o botão com firmeza, afastar o dedo do volante, pressionar com firmeza de novo e assim vai… coisa pouca, mas que na frequência em que ocorre no dia a dia vai aborrecendo o motorista.
Também são confusos os comandos dos vidros, que na porta do motorista têm apenas botões para a esquerda e para a direita. Conforme o desejo de operar vidros dianteiros ou traseiros, é necessário apertar um o escrito Rear, que não tem relevo e se acende com discrição para indicar que funcionará com as janelas de trás.
TELAS FRACAS Produtos de apelo tecnológico necessariamente precisam de boas telas. Não é questão de tamanho, mas de qualidade, resposta ao toque e interfaces. E em nenhum desses pontos o ID.4 manda bem.
A multimídia de 10” não acompanha a tecnologia veicular, apresentando baixa resolução e menu confuso, que demanda tempo para ser entendido. Pior ainda é o quadro de instrumentos digital de 5,3”, que parece um computador de bordo dada as poucas informações que consegue exibir. Sua resolução é baixa a ponto de pixelar algumas fontes tipográficas mais finas.
PERFORMANCE O ID.4 é comercializado no Brasil em versão única, a Pro Performance. Mas o nome engana, assim como os 204 cv e 31,5 kgfm do motor traseiro.
Ele é até bom nas retomadas, mas vai de 0 a 100 km/h em 8,4 s, que mostram o impacto das suas mais de 2 toneladas no desempenho. Esse peso fica evidente até ao abrirmos as portas, que chegam a lembrar de veículos blindados. Mas também ajuda a assentar o utilitário em curvas, pelo menos.
COMERCIALIZAÇÃO Se é atento, reparou que em momento algum dissemos que o ID.4 é “vendido” no Brasil. Tanto ele quanto a VW ID.Buzz chegaram ao mercado exclusivamente por assinatura, afastando a oportunidade de alguém ser realmente o dono de um VW elétrico. No fim há poucas vantagens, ainda mais quando damos conta de que a mensalidade não sai por menos de R$ 9.990.
O contrato mínimo é de 24 meses, de forma que ao final de dois anos o locatário terá gastado R$ 239.760 e ficará de mãos abanando. Por esse valor, dá para comprar um Volvo EX30 intermediário e ter algo para chamar de seu.
Além disso, a franquia é de 1.000 km/mês, sendo cobrados R$ 1,50 por quilômetro excedente. Caso queira a cota de 2.500 km/mês, por exemplo, o valor mensal sobe para R$ 11.890. Se acrescentar blindagem, serão R$ 15.990/mês. Caso ainda queira alugar um wallbox, a fatura total será de R$ 16.589 a cada 30 dias. Ou R$ 400.000 ao fim da assinatura.
Mesmo o plano básico inclui seguro, mas a coparticipação é de incríveis R$ 20.000 em todos os casos. O prazo de entrega do carro após a assinatura do contrato é de 90 dias. Cerca de 200 carros serão disponibilizados assim.
Documentação e carro reserva estão inclusos, assim como as revisões periódicas. Mas elétricos demandam menos idas à oficina, e se o ID.4 for revisado duas vezes em dois anos já será bastante.
DEFASAGEM Não bastasse gastar centenas de milhares de reais para devolver o carro ao fim do contrato, o condutor do ID.4 deve se contentar com um veículo desatualizado desde a hora que sair da concessionária.
Isso porque, em outubro, o modelo ganhou novidades na Europa, e não estamos falando de coisa pouca (muito pelo contrário): um motor inédito elevou os números do carro para 286 cv e deu-lhe incríveis 75% a mais de torque, chegando aos 55,6 kgfm.
Baterias de nova geração atingiram a proeza de elevar o alcance para 550 km com os mesmos de 77 kWh. Por fim, a multimídia agora tem 12,9”, melhor qualidade de imagem e novo sistema operacional.
O software também foi aplicado ao quadro de instrumentos, que utiliza melhor seu espaço limitado. Os botões do volante tiveram os defeitos apontados no texto corrigidos e os comandos deslizantes do ar-condicionado agora têm operação mais fácil.
Se, no fim das contas, o Volkswagen ID.4 parece um bom negócio, é possível ter um por 24 meses acessando o site do VW Sign&Drive.