Em meio à pandemia do coronavírus, nunca foi tão difícil exercer o trabalho diário de jornalismo. Primeiro, óbvio, pelos riscos frente a essa doença, muitas vezes fatal.
Ele há de ser calculado e estudado e isso lembra o saudoso Niki Lauda, que abdicou do título de 1976 na F1 porque achou que o risco estava além do aceitado por ele. QUATRO RODAS funciona desse jeito.
Voltando a falar da produção de conteúdo nesses tempos, tivemos nas últimas semanas um grande desafio: fechar a edição de junho de 2020 da revista com o VW Nivus na capa.
Foram horas de negociações e planejamento até conseguirmos o resultado final, divulgado nos últimos dias. Para chegarmos a esse estágio, porém, muita coisa aconteceu.
Especialmente por se tratar de um lançamento mundial, que ainda não fora revelado e vinha sendo protegido a sete chaves.
Como a unidade fotografada tem um tom laranja forte e sua principal novidade é o desenho traseiro, surgiu dos editores de fotografia, Fernando Pires, e de arte, Fabio Black, a ideia: por que não criar uma capa mostrando o carro de traseira em um chamativo fundo vermelho?
O mais surpreendente, após terminado o trabalho, foi receber o comentário do leitor Yuri Leite no Facebook apontando para uma enorme coincidência com outra capa de QUATRO RODAS.
Em novembro de 1993, na edição 400, colocamos na capa outro VW que prometia ser revolucionário na época, o Pointer. Que tinha, assim como o Nivus, o balanço traseiro como principal destaque.
Por um felicíssimo acaso do destino, naquela ocasião também decidimos criar um fundo vermelho e colocar na capa o veículo num ângulo de traseira.
Se os resultados foram tão parecidos, em 27 anos muita coisa mudou nos métodos de produção e edição do conteúdo.
A começar pelo tempo disponível para trabalhar a reportagem e a capa: se o Pointer foi revelado quatro meses antes do lançamento, a capa do Nivus chegou às bancas praticamente junto com a apresentação mundial do modelo.
Por isso mesmo, tivemos só uma semana para fazer as fotografias com o carro definitivo em estúdio, andar no protótipo (ainda camuflado) em nossa pista de testes e, claro, produzir toda a reportagem a tempo de a revista ir para a gráfica e chegar às bancas no prazo estabelecido.
Outra diferença importante: com o Pointer GTI, tivemos 36 horas de estúdio para produzir as fotos registradas por Antonio Rodrigues. Até um espelho formado com 7.200 litros d’água foi criado para dar um “tcham” às imagens.
Já com o Nivus, Fernando Pires destrinchou mais de 60 imagens em apenas duas horas, prazo estabelecido (e cronometrado) pela própria VW. Tempo que incluiu manobras do carro em um estúdio apertado para encontrar os melhores ângulos.
Sorte que nosso editor fotográfico dispõe hoje de recursos que Antonio Rodrigues não tinha na época do Pointer, como uma câmera digital que exibe os resultados do trabalho na hora, além da possibilidade de trabalhar com fundos e efeitos na edição.
“Como sou de uma geração de fotógrafos da era digital, penso sempre nas alternativas que tenho utilizando a pós-produção, o famoso Photoshop. Com o carro, o essencial é criar imagens limpas, com pouco reflexo, boa iluminação, ângulos corretos e usando bem técnicas com polarizador e tecidos”, conta Fernando.
Após concluídas as imagens, o trabalho ainda não acabara para Fernando Pires. Seria preciso selecionar as melhores fotografias, diagramar a reportagem de oito páginas e criar a capa ao lado do colega Fábio Black.
A ideia inicial seria mostrar o Nivus de frente, com efeito de movimento e uma paisagem de nossa pista de testes em Limeira inserida ao fundo. É aqui que revelamos o segredo: em nenhum momento a capa do Pointer foi usada como referência.
Mas, na prática, parecia faltar algo. “O Paulo [Campo Grande, redator-chefe de QUATRO RODAS] achou que, com a foto de frente do Nivus, seu maior diferencial, que era a traseira totalmente nova, ficaria escondido”, relata Fábio.
Veio então a ideia de usar uma grande imagem de traseira. O que seria arriscado, porque acredite: é difícil compor uma boa capa de revista com fotos de traseira de um carro. Os casos de Nivus e Pointer são exceções.
Como Fernando Pires não havia feito uma foto de traseira que permitisse a inclusão de um fundo com paisagem, os editores de arte acabaram resgatando uma ideia surgida numa edição do especial Melhor Compra que acabou nunca sendo publicada: o fundo vermelho.
“Era o que precisávamos para dar vida e força para o Nivus aparecer de traseira na capa de QUATRO RODAS”, analisa Fábio Black.
Mas a montagem pretendida por Fernando Pires, com o Nivus em movimento na nossa pista de testes, não foi perdida: ela acabou ilustrando a página dupla de abertura da matéria (e também a imagem de abertura das impressões no site).
Todos da equipe adoraram o visual, que foi aprovado com louvor. A edição 734 de QUATRO RODAS foi lançada e logo veio a comparação com a clássica edição 400 do Pointer GTI.
Mas, se a capa do Nivus não foi inspirada no Pointer, por que ambas ficaram tão parecidas? Certamente porque ambos os modelos se parecem muito em proposta, tendo o caimento da traseira como grande destaque.
Ou seja: esta coincidência não foi tão coincidência assim.
Nestes 60 anos de QUATRO RODAS, os profissionais que integraram, integram e integrarão nossa redação sempre seguirão o mesmo trilho editorial, preocupado com as melhores soluções para compor e ilustrar o conteúdo jornalístico.
As duas capas em questão são provas disso. É a tradição mesclada com modernidade que ajuda a manter toda a credibilidade construída pela marca ao longo de seis décadas.
Quanto ao Nivus e ao Pointer, vale dizer que o último jamais chegou perto de alcançar o sucesso esperado pela fabricante. Será que o SUV cupê do Polo terá um destino melhor? QUATRO RODAS estará aqui para relatar tudo.
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