A trágica história do Ford Flivver, avião “popular” menor que um Corolla
Idealizado por Henry Ford, avião pequeno teria produção em massa, peças do Model T e levaria só o piloto. Mas seu final foi catastrófico
![fordmonoplane-960×424](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/fordmonoplane-960x424.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Henry Ford conseguiu fazer o primeiro carro popular e global.
Entre 1908 e 1927, mais de 15,4 milhões de Ford T foram produzidos em 14 fábricas em todo o mundo – uma delas no Brasil. Tinha a fama de seguro, simples e barato, que Ford quis levar para os ares.
Em 1909 o magnata mostrou o Ford-Van Aucken Monoplane, baseado no avião francês Blériot XI – o primeiro a cruzar o Canal da Mancha.
Uma das diferenças entre os dois estava no motor: em vez de um 3-cilindros italiano, usava uma versão mais potente do 4-cilindros 2.9 do Ford T.
A aeronave mais famosa da Ford, porém, só surgiu em 1925. O Ford Trimotor (também conhecido como The Tin Goose, ou Ganso de Lata) era um dos mais avançados de seu tempo e podia levar 10 passageiros por até 1.000 km.
As 199 unidades produzidas foram usadas por forças aéreas e empresas nas Américas e na Europa.
![ford-tri-motor-eaa-jpg_1499705459](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/ford-tri-motor-eaa-jpg_1499705459.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Só que o Trimotor não era um projeto Ford, mas sim da Stout Metal Airplane – que havia sido comprada pela Ford naquele ano. Só deu tempo de transformar o monomotor inspirado no Fokker F.VII em uma aeronave com três motores refrigerados a ar da Curtiss-Wright.
Mas foi a compra da Stout que fez Henry Ford idealizar um avião que qualquer um poderia ter e pilotar, repetindo o feito que havia conseguido com o Ford T nas ruas de todo o mundo.
Batizado de Ford Flivver (nome derivado de uma gíria para carro barato no início do século XX), foi um dos menores monoplanos já construídos.
Tinha cerca de 160 kg,e 4,57 m de envergadura – 5 cm a menos que o comprimento de um Toyota Corolla.
![Ford_Flivver_aircraft](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/ford_flivver_aircraft.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Tem motivo: Henry Ford definiu que o avião deveria ser pequeno o suficiente para caber em seu escritório.
Este primeiro protótipo usava um motor 3-cilindros Anzani semi-radial de 36 cv – o mesmo do Blériot XI –, mas seu escape era uma adaptação daquele usado no Ford T.
A fuselagem era de aço tubular e as asas, de madeira revestida com tecido. O roda de trás era manobrável e a única com freio. Havia espaço apenas para o piloto – e não era dos melhores.
![Anzani_Military_Model_Fan_type](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/anzani_military_model_fan_type.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
“No momento, este avião deve ser considerado totalmente experimental”, disse Ford na apresentação do Flivver em 1926, como parte das comemorações do seu aniversário de 63 anos.
Quem pilotou o Flivver naquele dia foi Harry J. Brooks, principal piloto de testes da Ford e o favorito de Henry Ford.
Brooks passou a voar com o Flivver regularmente da garagem de sua casa para o aeroporto Ford (hoje parte do centro de desenvolvimento da Ford, em Dearborn, EUA).
Mais tarde, usaria um segundo protótipo para voar entre as propriedades de Ford.
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Outro piloto apenas pôde pilotar o aviãozinho da Ford. Charles Lindbergh ficou famoso por ter feito o primeiro vôo transatlântico solo e sem escalas, entre Nova York e Paris, em maio de 1927.
Em agosto daquele ano, a convite da Ford, pilotou seu monomotor. “Uma uma das piores aeronaves que ele já voei”, disse posteriormente.
Em sua segunda fase de protótipo o Flivver ganhou novas asas, com 6,70 m de envergadura, fuselagem de tecido, tanque de combustível de 50 litros e um novo motor 2.3 de dois cilindros contrapostos de 40 cv desenvolvido pela própria Ford.
A intenção era bater o recorde de distância percorrida para aviões com peso entre 200 e 400 kg.
Na primeira tentativa, testemunhada por Henry Ford em janeiro de 1928, Harry Brooks só conseguiu chegar até a Carolina do Norte, o meio do caminho.
![the-crash-that-doomed-henry-fords-flying-car-2](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/the-crash-that-doomed-henry-fords-flying-car-2.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Mais tarde, em fevereiro, Edsel Ford acompanhou a segunda tentativa. A aeronave fez um pouso forçado 320 km antes do destino, em Titusville, Flórida. Mas ainda assim obteve o recorde por ter percorrido 1.200 km sem reabastecimento.
Naquela noite, Brooks consertou as avarias causadas pelo pouso forçado e colocou palitos de madeira na ventilação da tampa do tanque de combustível para evitar que a umidade entrasse ali durante a noite.
No dia seguinte, seguiu rumo a Miami sobrevoando o Atlântico. Mas não chegou lá: o motor parou e a aeronave caiu no mar. O corpo de Brooks jamais foi encontrado.
Mais tarde as investigações mostraram que os palitos, provavelmente esquecidos na tampa do combustível, bloquearam a passagem de ar levando à parada do motor.
![Ford_Flivver_Henry_Ford_Museum](https://gutenberg.quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2019/05/ford_flivver_henry_ford_museum.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Harry Brooks e Henry Ford se tornaram íntimos com a empreitada do Flivver. Ford ficou perturbado com a perda do amigo e o desenvolvimento do avião foi interrompido.
O que se dizia na época é que Ford Flivver poderia custar 37.000 dólares, valor que baixaria para 28.000 dólares caso fossem feitas mais de 100 encomendas. Parece barato, mas um Ford T custava 360 dólares na época.
Corrigindo os valores, o Ford T era um carro de 5.192 dólares e o Flivver, um avião de 533.000 dólares. Não era para qualquer um.
Talvez Ford nunca tenha desistido de fazer seu carro voador. “Pode anotar. Uma combinação de avião e automóvel está chegando. Você pode rir. Mas virá”, disse em 1940. Ainda estamos esperando por esse momento.