Criador da rota do Sertões há 20 anos começou usando o Guia Quatro Rodas
Mesmo com o apoio da tecnologia, o diretor técnico do Sertões, Du Sachs, percorre todo o trajeto do rali por duas vezes antes dos competidores
Durante o Rally dos Sertões, o escritório de Du Sachs é uma Mitsubishi L200 manual que fica parada pouco antes da largada de cada etapa. O carro é bem equipado: tem antenas de rádio e GPS no teto, um celular e um GPS no painel e um computador, além de um enorme guarda-sol que ajuda a protegê-lo do calor. Próximo, ainda está um receptor de internet de alta velocidade via satélite.
Du Sachs é diretor técnico do Rally dos Sertões e é responsável por criar todo o roteiro e a planilha que é seguida por pilotos e navegadores há 20 anos. Mas seu trabalho não para quando o rali começa.
Aproveitamos o intervalo entre a largada das motos e a dos UTVs Araguaiana (MT), início da da especial que se estenderia quase até São Félix do Araguaia (MT), para conversar não apenas sobre a criação do Sertões deste ano, que é o maior rali do mundo, mas seu início no mundo do rali.
Nessa, Sachs confidenciou que a ideia era fazer um rali com mais que os 7.203 km deste ano, que atravessa todas as regiões do País. “A proposta original era largar do Chuí e terminar no Oiapoque, mas a logística não permite, especialmente lá para cima por causa das travessias de balsa”.
Du já tem compromissos para depois da chegada ao final do rali, em Salinópolis (PA). “Estamos vendo de descer de avião para começar a fazer um pré-roteiro da etapa de 2023. Mas a parte de desenhos mesmo nós deixamos para depois do período de chuvas, que se estende até fevereiro, pois as águas destroem tudo, derrubam pontes e isso muda todo o roteiro. Por experiência, a gente deixa isso para abril”.
Sobrevoar a área sempre ajuda a encontrar novos caminhos, mas no passado era um certo guia rodoviário era a principal ferramenta de Du Sachs para começar a esboçar o Rally dos Sertões do ano seguinte.
“Há 20 anos eu usava um Guia Quatro Rodas para encontrar as cidades nas regiões onde queríamos passar. La para 2005 comecei a usar o GPS e o avião: o piloto falava “vai ter um Y à esquerda” e quando ele falava “já” eu marcava no GPS a localização exata do waypoint. Depois ia por terra ligando esses pontos. Quando era mapa, você chegava no meio do nada você sabia a direção mas não sabia por onde ir. Com o avião você tem mais noção, mas sempre podia ter um obstáculo no meio do caminho ou uma ponte que não existe mais”, conta.
Mas esse processo evoluiu muito nos últimos anos. “Hoje já estamos levantando 95% do percurso pelo Google Earth, sentado em casa. Aí na montagem do roteiro, se tem alguma surpresa, é só desviar de uma fazenda ou de algum obstáculo.
Feito o levantamento, um mês depois retornamos para fazer a conferência. Daí digitalizamos tudo, criamos um caderno padrão e vem uma equipe de três ou quatro carros com os diretores adjuntos fazendo o fechamento em cada região. Hoje somos 120 pessoas com 10 carros fazendo esse fechamento”.
Enquanto os pilotos se esforçam para cumprir os mais de 7.200 km deste ano, Du Sachs já está quase completando sua terceira passagem por esse roteiro. “Já estou indo para a casa dos 21.000 km só para esta edição dos Sertões”.
Para definir a velocidade dos carros em cada trecho, é pura matemática. Naquele dia, uma enorme reta até a cidade de Cocalinho (MT) permitiria que cada veículo beirasse sua velocidade máxima: mais de 200 km/h para os carros, cerca de 180 km/h para as motos e os 130 km/h dos UTVs, que têm limitação de máxima. “O maior obstáculo será a poeira”, advertia Sachs com a experiência de quem já esteve no lugar dos pilotos.
“Eu corri quatro anos no Sertões. Vim de rali de regularidade de moto, até que o piloto piracicabano Benedito Giannetti foi convidado pela Mitsubishi para correr no Sertões em 1997. disseram que ele precisaria de um navegador e me indicaram. Ainda era a quinta edição.
Corri com ele por dois anos, com outros pilotos por mais dois anos e em 2000 o Marcos Morais, que era o dono da empresa, me chamou para conversar em Piracicaba. Disse que tinha alguns problemas no fechamento, porque várias pessoas faziam as planilhas. E disse a ele que aceitaria fazer isso com uma condição: ninguém mais colocaria as mãos na planilha. E ele aceitou e começamos essa parceria”, conta Du.
A conversa estava boa, mas um chamado no rádio interrompera. Era o piloto do Pelicano, um dos aviões que se revezam para acompanhar os pilotos nos locais mais remotos, dando bom dia ao Du Sachs.
A partir daquele momento o diretor técnico da prova daria estabeleceria uma parceria providencial para a segurança da prova. O piloto da aeronave faz a ponte, via rádio, entre Sachs e os pilotos. Se um piloto reporta um problema, Du Sachs olha a localização dele em tempo real em seu computador e sinaliza, por exemplo, uma área de escape.
Não demorou para isso acontecer. O piloto francês Adrien Metge queria abandonar a prova com sua Yamaha e comunicou ao Pelicano, que repassou a informação a Sachs. Este localizou o piloto próximo ao quilômetro 120 e alertou que só haveria uma saída para a pista de apoio quando chegasse perto dos 180 km de prova. Mais tarde, o Pelicano também observaria a presença de público em trechos por onde os veículos passariam em alta velocidade e reportaria aos pilotos.
Mas não era só isso. O telefone de Sachs não parava de tocar. Eram chamados da chefia do rali e até mesmo de políticos da região lamentando pelo Sertões não parar em sua cidade. E era apenas o início de mais um dia naquela L200 transformada em escritório.