Adeus ao W16 8.0? Bugatti Chiron sai de linha e marca terá futuro elétrico
Produção das 500 unidades do Bugatti Chiron chegou ao fim, mas este ainda não é o fim do complexo motor W16 8.0 quadriturbo de 1600 cv
Após seis anos, chegou ao fim a produção do Bugatti Chiron, um dos esportivos mais rápidos, complexos e extraordinários já produzidos.
As últimas 30 unidades foram da série Bugatti Chiron Super Sport 300+, equipados com a versão mais potente do motor W16 8.0 quadriturbo produzida nos últimos 20 anos. Foi o protótipo deles o primeiro carro de produção a romper a barreira de 300 mph (482 km/h), chegando aos 490.48 km/h em agosto de 2019. O último exemplar foi entregue ao comprador neste mês.
Agora a Bugatti prepara uma revolução. Tem nova identidade visual e nova organização: há um ano, a marca de origem francesa e que pertence ao grupo VW, passou a formar uma joint venture com a fabricante croata Rimac.
A nova empresa se chama-se Rimac-Bugatti LLC e combinará a experiência centenária da marca francesa, com a tecnologia adquirida pela empresa croata com carros elétricos, para criar uma nova gama de hipercarros elétricos.
A partir de 2023, a nova empresa terá sede única no Campus Rimac, um centro de desenvolvimento e pesquisas tecnológicas em Zagreb, que contará com 2.500 funcionários. Até o momento, ambas as marcas juntas empregam 430 pessoas – 130 na fábrica da Bugatti em Molsheim, na França, e 300 na capital croata.
O Rimac Group será dono da maior fatia da nova empresa, com 55% de participação. A Porsche, que assim como a Bugatti também pertence ao grupo Volkswagen, terá 45%. Vale lembrar que após investimentos de 83 milhões de euros, a Porsche virou detentora de 24% do Rimac Group, dividindo o resto com Mate Rimac, criador da empresa que detém 37%, a Hyundai Motor Group com 12% e outros investidores que compõem os 27% restantes.
A Rimac, diferente da já consolidada Bugatti, é uma empresa recente, fundada em 2009 – quando Mate tinha somente 21 anos. De lá pra cá, se especializou no ramo de motores elétricos e baterias, podendo ser essa a tecnologia que a marca francesa esteja procurando para substituir o seu W16 a gasolina. Todo o fornecimento de tecnologia e desenvolvimento ficará a cargo da Rimac Technology. Essa nova entidade será uma empresa independente – que também pertence ao Rimac Group – portanto, pode trabalhar para montadoras de todo o mundo.
O motor mais singular do mundo
Há quase 20 anos, quando surgiu a bordo do primeiro protótipo do Bugatti Veyron, o motor W16 8.0 conseguiu impressionar o mundo com seus 1.001 cv e 127,5 kgfm. Era um carro com aceleração de 0 a 100 km/h em apenas 2,5 segundos e velocidade máxima de mais de 400 km/h. Não à toa, o Veyron foi o primeiro hiperesportivo do mundo.
O que não se imaginava àquela altura é que este motor extremamente complexo teria um ganho de potência de quase 60%.
Lançado em 2016, o Bugatti Chiron mantinha o motor com quatro turbos. Mas seus turbocompressores eram ainda maiores e ainda passou a contar com sistema de injeção de combustível duplex com 32 válvulas de injeção, e maior uso de carbono e titânio para ajudar a compensar os aumentos de peso. A potência inicial foi de 1.500 cv, posteriormente aumentada para 1.600 cv e torque máximo de 163 kgfm.
A Bugatti também costuma bater na tecla da confiabilidade. Apesar do número de cilindros, esse motor é menor que um V12 graças ao fato de sua estrutura ser, basicamente, de dois motores V8 unidos em um ângulo de 90° entre si. Os 16 cilindros garantem suavidade, mas para cada cilindro poder funcionar no seu limite de desempenho há um sistema complexo de monitoramento da detonação em cada cilindro.
O Chiron usa sistema de lubrificação por cárter seco, ou seja, em vez do óleo que lubrifica o motor ficar depositado no cárter sob o motor, ele fica acumulado em um reservatório separado, onde seu resfriamento é mais eficiente. Neste caso, a lubrificação se dá exclusivamente sob pressão – em carros “normais”, ela funciona por gravidade.
Para chegar aos 1.600 cv, passaram a usar turbocompressores de dois estágios, no qual dois turbos entram em ação um após o outro. Estes já são 69% maiores que os do Veyron. Somente quando todos os quatro turbocompressores – dois em cada bancada de cilindros – estão em uso, o motor atinge sua potência máxima. A válvula de gás de escape que faz parte desta operação é feita de uma liga especial, o que a torna capaz de suportar temperaturas de 980°C enquanto permanece totalmente móvel.
Para manter a temperatura ideal de funcionamento, há 10 radiadores em um complexo sistema de refrigeração a água, com dois fluxos de fluido de arrefecimento que, juntos, somam 40 litros. O ciclo de baixa temperatura com uma bomba de água separada tem 15 litros para reduzir a temperatura do ar aquecido dos turbocompressores em até 130 graus em dois trocadores de calor no motor. Há também resfriadores para o óleo do diferencial, óleo da transmissão e óleo do motor, além de um trocador de calor para o sistema de ar condicionado.
Por sinal, o sistema de ar-condicionado do Bugatti Chiron poderia resfriar um apartamento de até 80 m². O sistema do superesportivo conta com um compressor de ar-condicionado, dois condensadores e cerca de 9,5 metros de linhas para refrigerar a cabine, onde passam três litros de líquido de arrefecimento com uma pressão entre dois e 30 bar por minuto.
Garantir o fluxo do ar-condicionado também é particularmente difícil em um carro feito para chegar a quase 500 km/h. O ar é forçado a entrar pela extremidade inferior do para-brisas, mas a partir dos 250 km/h o veículo aciona um mecanismo adicional composto por um ventilador e uma nova aba de ar, que permite que o ar continue sendo dissipado no habitáculo. Além disso, o sistema de resfriamento tem que conter o aquecimento interno causado pelo (enorme) para-brisas dianteiro.
Fabricação é uma tarefa árdua
O motor W16 é feito dentro da fábrica de motores da Volkswagen em Salzgitter – em uma sala separada reservada exclusivamente para a construção do motor Bugatti.
Dois especialistas levam seis dias para montar manualmente as 3.712 peças individuais do motor. O único equipamento eletrônico utilizado no atelier é um torquímetro computadorizado, para que cada parafuso seja apertado com a força exata.
O motor acabado é então cuidadosamente embalado e transportado para Molsheim, onde o motor e a transmissão são testados por oito horas antes de serem entregues à linha de montagem final do Chiron no Bugatti Atelier.
Lá está o dinamômetro de roda mais poderoso do mundo, girando tão rápido que acaba produzindo uma corrente elétrica de 1.200 amperes, energia que é retornada para a rede elétrica da fábrica. Nos testes de dinamômetro, o motor é exigido ao máximo por períodos de duas a três horas.
Não há robôs na fábrica, apenas 12 estações para cada etapa do processo, onde trabalham 20 profissionais altamente especializados. Depois de finalizados, cada Bugatti Chiron foi testado por 700 km em testes por rodovias sinuosas e autobahns (o atelier fica quase na fronteira da França com a Alemanha) antes de serem entregues aos clientes.
É o fim do motor W16 8.0?
Ainda não. A Bugatti ainda lançará, em 2024, o hiperesportivo Bolide. Ele foi desenvolvido para atender aos padrões de segurança da FIA, tem desenho focado em aerodinâmica e downforce e combinará o motor W16 8.0 a gasolina com uma carroceria mais leve. Apenas 40 unidades serão produzidas.
O carro pesaria apenas 1.450 kg, chegando na relação de peso/potência de 0,9 kg/cv: o motor de 16 cilindros em W com quatro turbos entrega 1.600 cv e 163 kgfm. Estima-se que o Bugatti Bolide será capaz de chegar aos 200 km/h em aproximadamente de 5 segundos.
Os números poderiam ser ainda maiores, isso porque o modelo conceitual era ainda mais potente (com 1.850 cv) e mais leve, com cerca de 100 kg a menos. Mas a gasolina era de 110 octanas, contra a de 98 octanas (mais comum a nível global) escolhida para o Bolide de produção.
Ainda assim, será um carro de pista. Tanto que para atender aos padrões da FIA (Federação Internacional de Automobilismo), contará com sistema automático de extinção de incêndio, cintos de segurança de seis pontos e travamento central das rodas. Os felizardos (e endinheirados) que comprarem o modelo terão ainda a chance de guiá-lo em um circuito fechado.