O que a Volkswagen pretende com o novo Golf 1.0 TSI?
Hatch médio, motor 1-litro e câmbio manual: será que essa configuração pode dar certo?
O motor que faz mágica no Up! TSI muito em breve estará disponível para ninguém menos que o Golf. Será a primeira vez que veremos no Brasil um carro médio com motor tão pequeno: o 1.0 TSI de três cilindros flex, com turbo e injeção direta, e aproximadamente 125 cv e 22 mkgf de torque a partir de 2.000 rpm – no caso do torque, é 30% a mais do que o 1.6 MSI, atingidos na metade dos 4.000 rpm necessários para que o EA-211 exerça toda sua força.
Este novo motor virá no Golf Comfortline combinado com o câmbio manual de seis marchas e deve servir como laboratório mercadológico para o conceito de downsizing (tendência de diminuição do tamanho dos motores sem comprometer o desempenho) em carros médios no Brasil.
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A nova versão deverá ser intermediária entre o Comfortline 1.6 MSI com câmbio manual de cinco marchas (R$ 78.130) e o Comfortline 1.6 MSI com câmbio automático de seis marchas (R$ 83.530), ainda que carros 1.0 paguem IPI menor que os 1.6.
Para isso, é provável que haja um reposicionamento (para baixo) de valores para as versões 1.6 MSI, de forma a encaixar o novo Golf 1.0 TSI em uma faixa um pouco acima da do Ford Fiesta 1.0 Ecoboost (hoje tabelado em R$ 71.990).
A despeito do motor pequeno, há boas chances de ser um carro agradável de dirigir. O Golf 1.6 com motor EA-211 tem 120 cv e 16,8 mkgf de torque para 1.218 kg e, apesar das críticas, não faz feio na estrada.
Considerando este mesmo peso e números de potência estimados, a relação peso/potência do 1.0 TSI cairá de 10,15 kg/cv para 9,74 kg/cv. Já a de peso/torque baixa de 72,50 kg/mkgf para 55,36 kg/mkgf. E quem não estiver dirigindo só perceberá que este não é um 1.4 TSI se notar a saída de escape única no lugar da dupla.
Vale dizer que este Golf já existe na Europa, onde há até mesmo o Ford Mondeo (nosso Fusion) é oferecido com motor 1.0 EcoBoost. Queimando apenas gasolina, o Golf 1.0 tem 115 cv e 20,4 mkgf de torque e até tem opção de câmbio DSG. E o mesmo motor também já equipa o Audi A3.
Em avaliação recente do jornal inglês The Telegraph, Chris Knapman diz que o motor “é silencioso, suave e forte, sem lag em baixas rotações característicos de motores turbo”. Também destaca que, por ter preocupação com consumo, o Golf 1.0 tem suspensão 1 cm mais baixa e rodar mais firme, e aconselha a compra da versão manual pelo fato do DSG antecipar muito as trocas. O zero a 100 km/h é cumprido em bons 9,7 s, com um consumo médio de impressionantes 23,25 km/l (mas deve-se notar que os ciclos europeus de medição de consumo são mais otimistas que os nossos).
Golf em desencanto
O passado recente do Volkswagen Golf no Brasil tem momentos de glórias e outros que merecem ser esquecidos. Se ao substituir o famigerado Golf 4,5, em 2013, a geração atual representou uma evolução enorme, ela também perdeu alguns equipamentos sucessivamente ao abandonar a nacionalidade alemã em favor da mexicana, e depois deixar de ser importado do México para ser fabricado nacionalmente. E pode estar aí a grande barreira para voltar a vender como antes.
Quando se tornou nacional, com produção em São José dos Pinhais (PR), houve perdas técnicas: o Comfortline perdeu o motor 1.4 TSI sem ter redução significativa de preço e tanto ele quanto o Highline trocaram a suspensão multilink pela de eixo de torção, mais convencional. Como se não bastasse, o 1.4 TSI ainda perdeu a companhia do câmbio DSG de dupla embreagem e sete marchas para formar uma parceria não tão perfeita com o automático Tiptronic de seis.
Consumidores de outros carros não ligariam para estas diferenças, mas o comprador do Golf é aquele cara que dá mais atenção à ficha técnica do que ao próprio design do carro. A curva de vendas do modelo no último ano deixa isso bem claro. Repare abaixo que houve altos e baixos até que, em dezembro, vendeu mais de 100% a mais do que em novembro.
Isso se explica pela chegada iminente do Golf nacional. Houve correria para as lojas ao mesmo tempo que descontos deixavam o Comfortline 1.4 TSI mexicano com câmbio DSG por cerca de R$ 70 mil quando a tabela era de R$ 75 mil. O Highline mexicano também caiu de R$ 84 mil para R$ 78 mil. Os números de vendas continuaram altos até o fim do estoque do Golf importado, em fevereiro.
Mês | Números de vendas |
---|---|
Agosto/ 2015 | 553 |
Setembro/ 2015 | 677 |
Outubro/ 2015 | 814 |
Novembro/ 2015 | 630 |
Dezembro/ 2015 | 1272 |
Janeiro/ 2016 | 961 |
Fevereiro/ 2016 | 907 |
Março/ 2016 | 619 |
Abril/ 2016 | 390 |
Maio/ 2016 | 334 |
Junho/ 2016 | 374 |
Julho/ 2016 | 338 |
Agosto/ 2016 | 279 |
De março até agora, o carro só viu seus números de vendas caírem. O declínio do segmento de hatches médios em favor dos SUVs compactos tem culpa, afinal, mesmo tendo vendido apenas 279 unidades em agosto, o Golf só emplacou menos do que o Ford Focus dentro da categoria. Ainda assim, nem mesmo o Golf 4,5 teve números tão ruins em seus oito anos de mercado.
Dá para ir mais fundo. De acordo com levantamento da consultoria Jato Dynamics, dos 3.923 Volkswagen Golf vendidos de janeiro a julho deste ano, 399 eram da versão GTI. Dos restantes, 1.677 ainda eram dos 1.4 TSI importados do México (cujos estoques, vale lembrar, acabaram em fevereiro!). Nacionais, foram 1.415 carros, sendo 992 com motor 1.6 e apenas 423 carros com motor 1.4 TSI.
Versão | Vendas |
---|---|
GTI | 399 |
1.4 TSI mexicano | 1.677 |
1.4 TSI flex nacional | 423 |
1.6 MSI flex nacional | 992 |
Total | 3.923 |
Este último dado mostra claramente que o objetivo do novo Golf 1.0 TSI não é substituir o 1.6 MSI, que mesmo bastante criticado já vende mais que o 1.4 TSI. É difícil, porém, encontrar sentido na oferta de quatro motores diferentes (1.0 TSI, 1.6 MSI, 1.4 TSI e 2.0 TSI) em um modelo que já não vende bem, dentro de um segmento que já teve dias bem melhores.
Se os rumores de que o 1.0 só sera vendido com câmbio manual – que responde por apenas 20% das vendas do Golf nacional – forem confirmados, a estratégia fica ainda mais complicada de entender.
Há muitas perguntas a responder. Se este Golf 1.0 TSI anda bem, saberemos em poucas semanas. Mas não é fácil imaginar um hatch médio 1.0 caindo no gosto do consumidor brasileiro – ainda mais levando-se em conta que ele não será nada barato.