Rolls-Royce com motor V12 de avião é tão insano que causou discórdia
Motivo de um longo processo, The Beast usa motor de caça da Segunda Guerra Mundial e conseguiu ser registrado como Rolls-Royce apesar da origem incomum
Há “clássicos” e clássicos. Quem entra nesse site britânico de leilões, por exemplo, logo encontrará muito do primeiro tipo, com a nata do luxo britânico no século passado à venda e com lances abertos. Mas também já encontrou “A Besta” (The Beast, em inglês), nada menos que um “Rolls-Royce” (a explicação das aspas está abaixo) com motor de avião de guerra e que marcou história no Reino Unido.
Construído a partir de 1966, o modelo é fruto da imaginação do engenheiro Paul Jameson. Britânico orgulhoso, Jameson criara seu primeiro chassi quando decidiu equipá-lo de maneira modesta, instalando um propulsor V12 27.0, oriundo das forças armadas locais.
Batizado de Meteor, esse motor, na verdade, é uma versão do icônico Rolls-Royce Merlin, uma das façanhas de engenharia mecânica que equipavam o caça Spitfire, determinante para a resistência britânica contra os nazistas na Segunda Guerra Mundial. Enquanto o Merlin tinha um supercharger, entretanto, o Meteor era naturalmente aspirado, com potência estimada entre os 750 cv e 950 cv
Com o motor instalado no chassi, foi a hora de um especialistas em transmissões, John Dodd, entrar em cena. Dodd comprou a bugiganga e adaptou um câmbio automático de três velocidades da General Motors ao projeto, que ainda ganhou transeixo e freios da Jaguar e suspensão de um Austin A110 Westminster.
Em seguida, o especialista encomendou uma carroceria de fibra de vidro e, dado que o motor era da Rolls-Royce, achou uma boa ideia colocar uma grade idêntica à dos carros da marca, incluindo o Espírito de Êxtase no capô. Em uma ironia tipicamente inglesa, Dodd ainda conseguiu registrar The Beast legalmente como um RR nos órgãos de trânsito locais, causando grande irritação na marca.
Em 1975, a Besta pegou fogo, e com o dinheiro do seguro foi possível aproveitar o chassi e, utilizando um outro V12 Meteor, reconstruir a carroceria, que se mantém até hoje. Em uma imensa novela, a Rolls-Royce processou John Dodd por uso indevido do seu nome e símbolos, levando-o a até perder sua casa no processo. O carro, entretanto, não foi recolhido e apenas trocou os emblemas originais pelas iniciais “JD”.
Após tantos entraves, a criação viveu seus dias glória: em 1977, o livro dos recordes da Guiness certificou a Besta como o carro mais potente do mundo, oficializando seus números em 761 cv e 105,0 kgfm. Desde então, o modelo foi estrela de diversas revistas e programas de TV, como o Top Gear. Em uma dessas aparições, chegou a atingir 293 km/h.
A venda
“Tão racional e prático quanto colocar um cachorro no comando de usina nuclear”, é a forma que a casa de leilões define comprar a bizarrice para uso no cotidiano. A Besta segue no nome de John Dodd, que faleceu em 2022, e sua família decidiu vender o carro a quem compreende sua importância.
A casa afirma que o licenciamento venceu em 2018 e que Dodd fazia questão de emiti-lo regularmente, se deliciando ao ver “Rolls-Royce” no campo que indica o fabricante no documento.
Esse é, oficialmente, um Rolls-Royce, que sobreviveu ao tempo, às chamas e à Justiça. O lance que o arrematou em leilão, em 2023, foi de 72.500 libras: relativamente barato para um “Rolls Royce” único.