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Comparativo: ambos flex, Clio e 206 protagonizaram a evolução francesa

Liberdade de opção entre álcool e gasolina, igualdade em preço, estilo e motor. Fraternidade, entre esses dois, nem pensar

Por Marcelo Moura
2 nov 2021, 13h49
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  • Teste comparativo entre o 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, e o Clio 1.6 16V Hi-flex Privilège da Renault, modelos 2005, testados pela revista Quatro Rodas.
    Depois do Renault Clio, o Peugeot 206 também virou flex para melhorar a briga dos franceses (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Publicado originalmente em abril de 2005

    Este comparativo começou em novembro de 2004, na coletiva de apresentação do Clio 1.6 16V Hi-Flex. Um jornalista perguntou: “A Renault não se incomoda em lançar o motor bicombustível quase um ano depois de Volkswagen, Chevrolet, Fiat e Ford?”. Ao que um executivo da montadora respondeu: “Não, tudo bem”. E completou, sorrindo: “Importa é que a gente chegou antes da Peugeot”.

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    Pensando melhor, este comparativo começou há mais tempo. Talvez em 1898, quando Louis Renault resolveu fazer concorrência aos carros já tradicionais de Armand Peugeot. Nos últimos 107 anos, a ação de uma montadora levou ao esforço de reação da outra, e isso manteve as duas vivas e simétricas. Hoje a Renault lidera o campeonato de Fórmula-1, mas não põe as rodas na principal categoria do mundial de rali, o WRC. Lá é território da Peugeot, que nos anos 90 teve uma passagem apagada pela Fórmula-1.

    Teste comparativo entre o 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, e o Clio 1.6 16V Hi-flex Privilège da Renault, modelos 2005, testados pela revista Quatro Rodas.
    Os hatches franceses têm os motores mais modernos da época, com números semelhantes (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Para ninguém confundir rivalidade com inimizade, saiba que no Brasil Clio e 206 compartilham o motor 1.0 16V e, lá fora, o V6 3.0 usado por Renault Laguna e Peugeot 407. As duas montadoras estiveram longe do Brasil por décadas, mas bastou a Renault inaugurar sua fábrica, em 1998, para a Peugeot (com sua irmã, Citroën) abrir outra. Na corrida pelo carro bicombustível, a Peugeot ri por último, com o 206 1.6 16V que chega agora. Resta saber quem ri melhor.

    A Peugeot não faz alarde sobre a nova injeção. Nada de Flexpower, Total Flex ou coisa parecida. É “Flex”, somente, escrito num adesivo na tampa do porta-malas. A boa notícia é que ele chega a toda a linha 206 1.6 16V (estender ao 307 ainda é um estudo) sem acréscimo de preço. O sistema é da Bosch e se resume a mudanças no mapeamento da injeção, velas com maior capacidade de dissipar calor, bicos injetores e bomba de maior vazão e reservatório de partida a frio.

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    Teste comparativo entre o 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, e o Clio 1.6 16V Hi-flex Privilège da Renault, modelos 2005, testados pela revista Quatro Rodas.
    Ambos os modelos eram muito bem equipados, mas apenas o Renault podia ter ABS (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Em versões e acessórios, nada muda. A má notícia fica para quem comprou o 206 SW logo no lançamento, há dois meses, e ficou sem opção na hora de abastecer. “Precisávamos fazer estoque e, na época, não tínhamos injeção suficiente”, justifica a montadora.

    Agora igualadas no bicombustível, Renault e Peugeot entram neste duelo particular armadas até os dentes: o Clio 1.6 16V Hi-Flex Privilège vem completo de série, com CD player e airbag duplo, por R$ 42.080. O único opcional é o freio ABS, que o Peugeot não oferece. O 206 1.6 16V Flex Féline não tem de série airbag nem CD player, mas custa menos (R$ 41.050) e traz de série vidro elétrico traseiro, sensor de chuva e de escuridão – três cartas que a Renault não tem no baralho.

    Teste comparativo entre o Clio 1.6 16v Hi-Flex Privilège, da Renault, e o 206 1.6 16V Flex Féline, da Peugeot, modelos 2005.
    Estilo é uma das características mais marcantes de Clio e 206 (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Ao lado de Fiat Palio e Citroën C3, são nossos pequenos mais recheados. O fato de terem chegado há menos tempo ao país, afirmam Peugeot e Renault, traz alguma distinção às marcas francesas.

    Outra boa conseqüência da presença recente: Clio e 206 têm dois dos motores mais modernos feitos no Brasil. Ambos 1.6, com 16 válvulas. Os dois tinham 110 cv, o que fazia muita gente achar que eram a mesma coisa. Agora, com álcool, o 206 vai a 113 cv – pouco atrás do Clio (115 cv). Os dois motores mantiveram a antiga taxa de compressão e, com gasolina, permanecem nos 110 cv.

    O Renault tem mais força (16 kgfm contra 15,5 kgfm) e em rotação mais baixa (3.750 rpm contra 4.000 rpm), mas a diferença é pequena. No prato da balança, mais semelhança: 1.005 kg para o Clio, 1.027 kg para o 206. Mas isso são números. Vamos ver o que ocorre na pista.

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    Perseguição no asfalto

    Clio e 206, lado a lado, começam a arrancada. Pé no fundo, pneus borrando o asfalto, marchas trocadas num golpe, passam-se 20 segundos e os dois rivais continuam emparelhados. No fim do primeiro quilômetro, passados 32,6 segundos, alguém abre vantagem.

    Motor do Renault Clio, testado pela revista Quatro Rodas.
    Motor 1.6 16V flex do Renault Clio (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    É o Clio, com o 206 no seu encalço, apenas 50 centímetros atrás do pára-choque traseiro. E haverá ultrapassagem adiante, porque o Peugeot tem câmbio mais longo e alcança 190 km/h, contra 187 km/h de seu rival. O 206 anda mais relaxado na estrada, e isso se traduz em consumo menor – mas não em silêncio, porque o pequeno Renault é mais quieto o tempo todo.

    O Clio não deixa barato: na cidade, ele é o mais vigoroso, graças ao câmbio mais curto e ao torque maior. Nas retomadas, só deu Renault: com gasolina, andou na frente do 206 usando álcool. Os dois imigrantes franceses fariam bonito na pista contra os concorrentes Fiat Palio 1.8 Flex, Ford Fiesta 1.6 Flex, Volkswagen Fox 1.6 Total Flex e Chevrolet Corsa 1.8 Flex Power: acompanham os mais rápidos na arrancada e os mais econômicos no consumo.

    Motor do 206 1.6 16V Flex Féline, da Peugeot, modelo 2005.
    Motor 1.6 16V flex do Peugeot 206 (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    No mano a mano, porém, Peugeot e Renault acabam empatados. Não deixe de passar na tabela de testes, no fim da reportagem, para se divertir com a série de empates e quase-empates. Já que a pista não decidiu nada, pode escolher pelo que lhe parecer mais bonito.

    O estilo dos dois é exemplo da tradição francesa de fazer tudo diferente. Não espere ver o vidro traseiro do Clio (curvo a ponto de distorcer as imagens) em outro carro, nem os faróis espichados do 206. Antes que fãs do Fiesta se levantem, esclareço que não se trata de beleza, mas de criatividade. Inusitado como estes dois, nessa faixa de mercado, só o C3 – que é feito pela Citroën, uma empresa da Peugeot.

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    Clio 1.6 16V Hi-flex Privilège, modelo 2005 da Renault, testado pela revista Quatro Rodas.
    Traseira com vidro arredondado é uma das marcas do Renault Clio (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    O 206 é referência de estilo desde o lançamento mundial, em 1998, mas as coisas mudaram um pouco. O retoque feito aqui em fevereiro de 2004 surtiu menos efeito que a plástica do Clio (de fevereiro de 2003). Curioso notar que, mesmo sem mudar muito, o visual do Renault está entrando na moda – é como um relógio parado que marca a hora certa duas vezes ao dia. Carros com forma blocada e robusta, que parecem mais assentados ao chão, são uma tendência (um exemplo é o Land Rover Discovery desta edição). Por mim, a disputa continua empatada.

    Farol do 206 1.6 16V Flex Féline, da Peugeot, modelo 2005.
    No 206, o maior destaque na aparência fica nos faróis espichados (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Contrastes dentro da cabine

    Basta abrir a porta, porém, para as diferenças saltarem aos olhos. A cabine do Clio é mais convidativa que a do 206, apesar de mais antiquada. O Renault tem estofamento atoalhado cinza, muito bonito de ver e gostoso de tocar. O painel de duas cores dá distinção e a cobertura das portas, de tom claro, deixa o ambiente arejado. O Peugeot é o contrário disso tudo: painel preto, carpete preto, revestimentos de porta pretos. Só falta escurecer o teto. O tecido dos bancos (adivinhe a cor…) é áspero.

    O visual do 206 condiz com sua proposta mais esportiva, mas mesmo o motorista com ambições de piloto merece capricho. Ao pegar o volante e a bola de câmbio, as mãos sentem rebarbas no plástico. Nos mesmos lugares, o motorista do Clio encontra, de série, revestimento de couro.

    Interior do 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, modelo 2005, testado pela revista Quatro Rodas.
    Interior do Peugeot 206 tem apelo esportivo, mas poderia caprichar mais no acabamento (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Uma coisa é entrar no carro, outra é ajustá-lo. Nisso, os dois carros são ruins. A regulagem de altura do volante é mínima e o comando dos vidros elétricos fica no pé da alavanca de câmbio. “Me estico tanto que meu braço direito está ficando mais comprido”, brinca o fotógrafo Marco de Bari, dono de um Clio.

    O banco do 206 não tem regulagem milimétrica de encosto, e a Lei de Murphy é implacável: as posições escalonadas pela montadora nunca batem com a sua vontade. E o ajuste de altura é para contorcionistas. O motorista precisa puxar uma alavanca e se levantar para o assento subir. Podia ser pior: o Clio nem regulagem de altura tem.

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    Painel do Clio Hatch 1.6 16V Hiflex Privilège, modelo 2005, da Renault, testado pela revista Quatro Rodas.
    No Clio, o desenho do painel é mais sóbrio, porém ele mostra mais qualidade no acabamento (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Mas, apesar de o Peugeot prometer mais esportividade, é o Renault que dá ao motorista mais condições de andar forte. A alavanca de câmbio tem engates mais curtos e certeiros e o pedal de embreagem tem curso bem menor.

    Nos rivais franceses, o espaço no banco traseiro serve para levar dois adolescentes ou três crianças. Três adultos? Se não forem parentes ou amigos, gente chegada, o mais gentil é oferecer carona até o ponto de táxi. Mas o Renault guarda algo valioso dentro do pequeno porta-malas: o estepe. No Peugeot ele fica embaixo do carro, numa armação de metal. Quando o pneu fura na beira da estrada, o motorista torce para encontrar a roda suja de poeira. Porque a outra opção, bastante comum, é simplesmente não encontrar.

    Bancos do 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, modelo 2005, testado pela revista Quatro Rodas.
    Espaço traseiro é semelhante nos modelos, mas só o 206 tem encostos de cabeça dianteiros vazados (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Detalhes tão pequenos fazem a vitória do Renault Clio 1.6 16V Hi-Flex Privilège. É o carro que transmite a maior sensação de requinte, conforto e desempenho, além de trazer de série os equipamentos mais interessantes. Se você não resistir à beleza e aos mimos tecnológicos do Peugeot 206 1.6 16V Flex Féline, vá em frente. Estará muito bem servido. E, em caso de dúvida, faça como a QUATRO RODAS: pergunte a quem tem.

    Bancos do 206 1.6 16V Flex Feline da Peugeot, modelo 2005, testado pela revista Quatro Rodas.
    Bancos do Clio têm revestimento de maior qualidade e conforto; espaço permite levar dois adultos com conforto (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Na última edição do prêmio “Os Eleitos”, publicada em dezembro de 2004, o 206 ficou na 11ª colocação entre os pequenos hatches, com reclamações sobre a durabilidade das peças, nível de ruído e rede autorizada. No Clio, a queixa dos proprietários ficou concentrada no preço, no valor de seguro e no consumo em estrada (alonga essa quinta marcha, Renault!). Sua posição na mesma categoria? Segundo lugar. Uma viva diferença.

    Peugeot 206 1.6 16V Flex Féline 

    206 1.6 16V Flex Féline, da Peugeot, durante teste comparativo com o Clio 1.6 16v Hi-Flex Privilège, da Renault. Ambos modelos 2005.
    Peugeot 206 (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Renault Clio 1.6 16V Hi-Flex Privilège 

    Clio 1.6 16V Hi-flex Privilège, modelo 2005 da Renault, testado pela revista Quatro Rodas.
    Renault Clio (Marco de Bari/Quatro Rodas)

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