Toyota GR Corolla enfrenta o Honda Civic Type R: qual o melhor na pista?
Os dois esportivos estão no mesmo patamar de preço e potência, mas provam na pista que são mais diferentes entre si do que aparentam
Finja surpresa. Você sabia que este comparativo aconteceria. Pode ser culpa do acaso ou de algum alinhamento cósmico, mas o fato é que Honda e Toyota estão trazendo para o Brasil, pela primeira vez, seus hatches mais potentes e ao mesmo tempo. O Honda Civic Type R e o Toyota GR Corolla também estão alinhados em desempenho e preço. É um momento histórico.
Os carros taxados como chatos serviram de base para os dois hot hatches mais desejados do mundo na atualidade, ainda que dos carros que vemos nas ruas possam ter sobrado apenas o painel e o nome. Ambos são fabricados no Japão quase artesanalmente em linhas dedicadas, e chegam ao Brasil em quantidade limitada a preços astronômicos.
Desta vez não há como fazer uma escolha racional, até porque o Honda Civic Type R custa a partir de R$ 429.990, mas todos os carros do primeiro lote têm monitor de pontos cegos e alerta de tráfego traseiro que elevam o preço para R$ 434.990. O Toyota GR Corolla tem preços que variam entre R$ 416.990, na versão Core, e R$ 461.990, na versão Circuit. As semelhanças param por aí.
Os raros Honda Civic hatch são cultuados no Brasil há anos e as três gerações do Civic Si vendidas por aqui garantem uma ligação da Honda com esportivos, o que a Toyota nunca teve. Ao despejar muita potência nas rodas dianteiras sem se tornar um carro indomável, o Civic Type R fez o que muitos fabricantes julgaram impossível e construiu fama global de devorador de curvas, com tempos recordes de volta entre os carros de tração dianteira nas pistas de Nürburgring, na Alemanha, e Suzuka, no Japão.
Esta geração do Type R, última só com motor a combustão, representa um ajuste fino com visual mais limpo e funcional. O ar que entra pela grade e sai pelo capô aumenta o downforce em 4,8 kg, enquanto o spoiler na base do para-choque dá mais 21 kg a 200 km/h. As tomadas de ar inferiores arrefecem o intercooler e os freios Brembo em até 60°C, enquanto os para-choques controlam a turbulência nas caixas de roda.
100 km/h em segunda marcha
Antes as rodas eram aro 20, mas agora têm 19 polegadas, para melhorar o conforto. Seu design tem efeito aerodinâmico e aumenta o contato dos pneus com o asfalto quando no limite da aderência. A preocupação com o peso fica evidente pelo capô de alumínio e pela tampa do porta-malas de plástico, 20% mais leve que a de metal das versões convencionais.
Isso e a geometria da suspensão dianteira com câmber ainda mais positivo serão meio subaproveitados no Brasil. A Honda foi conservadora e limitou a potência do motor temendo o álcool da nossa gasolina. Dessa forma, o K20C1, um quatro-cilindros 2.0 turbo com injeção direta usado pelo esportivo desde 2015, está fraco como nunca: os 297 cv e os 42,8 kgfm só aparecem entre 2.600 e 3.500 rpm. Na Europa e no Japão, esse motor passou dos 320 para 330 cv e de 40,8 kgfm a 2.500 rpm para 42,8 kgfm a 2.200 rpm nessa geração.
Mesmo assim, é um esportivo diferente, impressionante e incrivelmente mais dócil que os antigos Civic Si. O modo Comfort ajuda o Type R a ser mais Civic, deixando a suspensão menos dura e o ronco mais discreto. É bom para chegar até a pista e só.
Existe um modo Sport, mas o mais extremo é o chamado +R, acionado por botão dedicado, que deixa a suspensão saltitante e dura, a direção pesada, o acelerador pronto, o quadro de instrumentos tomado pelo conta-giros e torna o punta-tacco automático mais reativo. Por fim, também abre a válvula no escape central, que deixa o ronco mais grave. Piso na embreagem, acelero e solto o pedal da esquerda: o motor estaciona a 4.000 rpm, enche e o carro salta para a frente sem escândalo. Encaixo a segunda marcha e reparo que o final dela é exatamente após romper a barreira de 100 km/h, com o alerta de troca apitando a 7.000 rpm.
Na curva, continuo pisando em busca de um limite que não existe, pois o bloqueio mecânico do diferencial dianteiro intercede para manter a aceleração enquanto traz o carro para dentro. A traseira acompanha tudo sem ficar solta. Penso: como conseguiram fazer um carro de tração dianteira ser assim e que até trata bem o motorista?
Pitada de insanidade
A direção variável é rápida, exige menos movimentação dos braços e é comunicativa como a de um Porsche. O câmbio tem alavanca levemente torta para a esquerda para ficar mais próxima e suas trocas são telepáticas até nas reduções, acompanhadas do belo ronco.
O Civic Type R parece certinho perto do GR Corolla, cujo propósito é ser divertido, independentemente do país ou da pista onde estiver, sem grandes preocupações estéticas ou com recordes. O aspecto de carro de corrida com grade enorme e para-lamas alargados para proteger as bitolas mais largas reforçam isso.
GR vem de Gazoo Racing, a escuderia da Toyota nas competições. Mas este Corolla é um projeto particular de Akio Toyoda, neto do fundador da Toyota e que esteve no comando da empresa até abril. Master Driver da marca, faz questão de dirigir todos os Toyota ao redor do mundo antes do lançamento (até o Etios brasileiro) e queria devolver ao Corolla a imagem de divertido de décadas atrás.
A receita aqui é mais tradicional: alívio de peso, motor potente, câmbio manual, tração integral e um pouco de insanidade. O capô não é de alumínio, mas é leve porque a carroceria usa chapas mais finas, que poupam 4,8 kg. Os para-choques são mais finos (-1 kg), os braços da suspensão são mais leves (-5 kg) e nesta versão Circuit o teto é de fibra de carbono, uma peça de 5,5 kg que substitui a de 8 kg para abaixar o centro de gravidade. A tampa do porta-malas é de plástico.
Escalaram um motor de competição: três-cilindros 1.6 com turbo roletado, pistões com parede mais fina e injeção direta e indireta (que podem funcionar juntas) do GR Yaris, um carro criado para homologação no mundial de rali, mas quase 40 cv mais potente. São 304 cv e 37,7 kgfm a 3.000 rpm até no Brasil, onde exige gasolina premium – como o Civic.
Quando o motor é exigido, uma portinhola abre-se sob a caixa de ar e aumenta a admissão. A exaustão é garantida pelo escape central, deixando o ronco mais encorpado. É uma caixa de ar tão grande que exilou a bateria no porta-malas. Na falta de boa parte do isolamento acústico, o barulho diferente do motor e o espirro da turbina invadem a cabine. Bem-vindo.
O Toyota tem câmbio manual de seis marchas, apenas bom. Os engates são duros e secos, mas também tem punta-tacco automático, providencial quando os pedais são tão distantes. A tração integral GR-Four muda tudo, especialmente porque no Brasil até a versão de entrada Core tem diferenciais de deslizamento limitado dianteiro e traseiro. Além da variação entre os modos Sport, Comfort e Eco, é possível mudar a distribuição de torque entre os eixos.
O modo padrão, com 60% da força na dianteira, é até chato. O botão Track no meio do seletor de tração divide a força por igual entre os eixos, deixando o GR Corolla extremamente ágil e equilibrado em curvas. Mas o ápice da diversão está em direcionar 70% da força para as rodas traseiras. Sem ajuste dos amortecedores, o GR Corolla é um pouco mais confortável e tende a sair de frente no limite, então você pode acelerar e usar a tração traseira para neutralizar isso e se divertir.
Joia da engenharia
O motor 1.6 é mais atento à pressão do pedal e reforça a sensação de o GR ser mais rápido. Porém, é menos estável ao redor dos 200 km/h e nas frenagens mais fortes. Pode ser efeito da direção mais leve ou do entre-eixos 6 cm mais curto (tem 2,64 m como um Corolla Cross, contra 2,70 m do Civic ou do Corolla sedã), bom para pistas mais travadas.
Nossos testes confirmaram essa impressão. Embora o GR Corolla chegue aos 100 km/h em 5,4 segundos, contra os 6,3 segundos do Civic Type R, o Toyota completa os 1.000 m de aceleração décimos de segundo mais rápido, porém a 212 km/h, 1 km/h mais lento que o Honda, mais estável.
A maturidade do projeto do Civic Type R fica mais evidente olhando para a cabine do GR Corolla, que poderia ser do Corolla GR-S (versão esportivada do sedã). Seus bancos apenas têm encostos laterais maiores e imitam ombros de bancos esportivos, mas não conseguem deixar o motorista rente ao assoalho. A central multimídia com tela de 7” com USB na tela é uma piada de mau gosto para um carro tão caro. A central do Honda tem aspecto melhor e sistema de data logger que indica ao motorista onde e como pode melhorar na pista.
A principal diferença entre os GR Corolla Core e Circuit é o teto de fibra de carbono, mas só o Circuit tem head-up display e o carregador sem fio de smartphone. Tanto o Civic quanto o Corolla trazem piloto automático adaptativo, frenagem de emergência e assistente de faixa. Mas nenhum GR Corolla chega com sensores de estacionamento ou câmera de ré.
Mais que um carro de tração dianteira muito rápido, o Honda Civic Type R é feito para beirar a perfeição. É uma joia da engenharia que dificilmente será superada e ganha esse embate por isso. Se seu objetivo é diversão e velocidade, o Toyota GR Corolla deve ser sua escolha. É o carro que vai deixar órfãos dos Subaru WRX STi e Lancer Evolution felizes, mas deveria justificar melhor o quanto vai custar.
Veredicto – A escolha é entre ter um carro histórico ou uma máquina de diversão. Dificilmente outro fabricante fará um carro a combustão como o Honda Civic Type R, vencedor do comparativo. A tração integral, porém, facilita evoluções por parte da Toyota, com o GR Corolla.
Teste de desempenho e consumo Quatro Rodas
Honda Civic Type R | Toyota GR Corolla | |
Aceleração | ||
0 a 100 km/h | 6,3 s | 5,4 s |
0 a 1.000 m | 25,6 s – 212,9 km/h | 24,8 s – 212 km/h |
Velocidade máxima | 275 km/h | 230 km/h (limitada) |
Retomadas | ||
2a 40 a 80 km/h | 3,4 s | 3,7 s |
3a 60 a 100 km/h | 4,2 s | 4,6 s |
4a 80 a 120 km/h | 5,2 s | 6 s |
Frenagens | ||
60/80/120 km/h a 0 | 12,8/22,9/52,7 m | 13,6/24,1/54,7 m |
Consumo | ||
Urbano | 9,6 km/l | 9 km/l |
Rodoviário | 13,3 km/l | 12,7 km/l |
Ruído interno | ||
Neutro/RPM máx. | 38,5/72,5 dBA | 45,2/73,8 dBA |
80/120 km/h | 68,1/71,2 dBA | 69,1/71,4 dBA |
Aferição | ||
Velocidade real a 100 km/h em 5a | 96 km/h | 94 km/h |
Rotação do motor a 100 km/h em 5a marcha | 2.250 rpm | 2.500 rpm |
Volante | 2 voltas | 2,5 voltas |
Preço básico | R$ 429.990 | R$ 416.990 |
Ficha técnica – Honda Civic Type R
- Motor: gas., diant., transv., 4 cil., 1.996 cm³, 16 V, 297 cv a 6.500 rpm, 42,8 kgfm entre 2.600 e 3.500 rpm
- Câmbio: manual, 6 marchas, tração dianteira
- Direção: elétrica
- Suspensão: McPherson (diant.), multilink (tras.)
- Freios: disco ventilado (diant.), disco sólido (tras.)
- Pneus: 265/30 R19 (diant.), 275/35 R20 (tras.)
- Peso: 1.449 kg
- Peso/potência: 4,87 kg/cv
- Peso/torque: 33,85 kg/kgfm
- Dimensões: compr., 459,4 cm; larg., 189 cm; alt., 140,1 cm; entre-eixos, 273,4 cm; porta-malas, 337 l; tanque, 47 l
Ficha técnica – Toyota GR Corolla
- Motor: gasolina, diant., transv., 3 cil., 1.539 cm³, 12V, 304 cv a 6.500 rpm, 37,7 kgfm a 3.000 rpm
- Câmbio: manual, 6 marchas, tração integral
- Direção: elétrica
- Suspensão: McPherson (diant.), duplo A (tras.)
- Freios: disco ventilado nas quatro rodas
- Pneus: 235/40 R18
- Peso: 1.485 kg
- Peso/potência: 4,88 kg/cv
- Peso/torque: 39,4 kg/kgfm
- Dimensões: comprimento, 440,7 cm; largura, 185,1 cm; altura, 147,9 cm; entre-eixos, 264 cm; porta-malas, n/d; tanque, 50 litros