As coisas aconteceram rápido para o Honda Accord. Se há menos de três anos encarava a troca do motor V6 3.5 de 280 cv por um moderno 2.0 de 256 cv com câmbio de dez marchas, agora evolui para um conjunto mecânico híbrido bem diferente. São três motores, dois elétricos e um térmico, com modos de trabalho específicos.
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Vou usar a mesma explicação que dei ao porteiro do meu prédio, que estranhou a música, um som quase celestial, que o Accord reproduz quando se desloca em baixas velocidades. É um jeito de alertar quem está ao redor, pois na maior parte do tempo quem move o sedã é um motor elétrico, com 184 cv e 32,1 kgfm. Não há barulho algum além dos pneus e do compressor do ar-condicionado.
Difícil é andar muito tempo sem que o 2.0 a gasolina seja ativado. A diferença para outros híbridos é que não há uma simbiose entre o motor elétrico e o motor a gasolina por meio da transmissão para impulsionar o carro. Seja a força do motor elétrico ou do térmico, vai direto para o diferencial dianteiro.
A tecnologia que a Honda batizou de e:HEV aciona os motores de acordo com a necessidade. O 2.0 a gasolina funciona como auxiliar do sistema na maior parte do tempo. Quando não está tracionando ou acionando o primeiro motor elétrico – que funciona como gerador de energia para o segundo motor elétrico, que é o responsável pela tração na maior parte do tempo –, o 2.0 está desligado.
Em arrancadas e baixas velocidades, apenas o segundo motor elétrico (de 184 cv) atua. Nas médias, o sistema entra no modo híbrido, com o elétrico tracionando e o térmico acionando o motor-gerador. A gasolina é queimada para produzir a eletricidade que vai impulsionar o motor de 184 cv e a que sobra é armazenada em uma bateria de 1,1 kWh – menor que a de um Toyota Prius, que tem 1,3 kWh. O motor térmico só traciona o carro em velocidades altas ou de cruzeiro, nas estradas.
O sistema seleciona os modos de funcionamento nos momentos em que cada um é o mais eficiente, fazendo com que o sedã entregue os melhores benefícios dos carros elétricos (sem ter a autonomia comprometida pela carga da bateria) e sendo econômico na cidade e na estrada (o que elétricos puros não permitem).
O pulo do gato
Uma embreagem eletrônica conecta o virabrequim do motor 2.0 diretamente ao diferencial dianteiro do Accord, em relação de marcha única que equivale a de uma quinta ou sexta marcha em um carro com câmbio. São 145 cv e 17,8 kgfm, números mais modestos que os de um Civic 2.0 (155 cv e 19,5 kgfm). Isso porque trabalha em ciclo Atkinson, que prioriza o consumo em detrimento de potência e torque.
Esta é a grande sacada do sistema híbrido e:HEV, da Honda, que parece muito complexo, mas tem princípio simples. Sem malabarismos como as embreagens que conectam os motores à transmissão, que são pontos de perda de energia. E essa é a teoria.
Na prática, o motorista não sente as mudanças nos modos de funcionamento do carro e só toma conhecimento se a central multimídia ou a tela do quadro de instrumentos estiverem configuradas para mostrar o fluxo de energia.
Quando o 2.0 atua como gerador, também varia sua rotação de acordo com a pressão do acelerador, como faz qualquer Honda com câmbio CVT. Isso evita a sensação estranha de sentir as vibrações do motor trabalhando em rotação fixa, como faz um gerador ou os extensores de autonomia de um BMW i3 Rex, por exemplo.
Outra coisa legal é que a pequena bateria recarrega tão rápido quanto esvazia. Isso porque o motor elétrico que impulsiona o carro também gera energia nas desacelerações. Faz isso naturalmente, como o efeito de um freio motor, mas é possível aumentar (ou reduzir) a intensidade deste efeito usando as borboletas atrás do volante – que antes serviam para trocar as dez marchas do câmbio automático.
Com a potência máxima de regeneração, a energia gerada ao descer uma rua de 200 m pode repor metade da bateria. Quem mora em locais com altos e baixos no relevo consegue ver a bateria cheia constantemente e isso é raro em híbridos comuns.
O antigo Accord 2.0 turbo chegava aos 100 km/h em 6,7 segundos e cravava 9,7 km/l na cidade e 14,9 km/l na estrada. O novo, híbrido, cravou 7,7 s no 0 a 100 km/h e fez 17,5 km/l em ciclo urbano e 17,2 km/l no rodoviário.
Com o modo elétrico ativado, o que só é possível em certas velocidades na cidade, o consumo ficou em 54,5 km/l. Um segundo a mais para chegar aos 100 km/h em troca de consumo urbano 80% menor não é nada mal em tempos de gasolina cara.
A tecnologia da mecânica surpreende, mas o resto do carro não. Ainda é um Honda Accord, um carro sensato até demais e que não deixa a eletrificação evidente na cabine. Mas que faz muito bem tudo que se presta a fazer.
O que mais chama atenção com relação a isso é a central multimídia, que, embora seja extremamente funcional e configurável (dá para corrigir até a temperatura externa exibida), tem tela pequena e pouco chamativa. Por outro lado, traz fontes grandes e todos os botões físicos possíveis ao redor.
A lista de equipamentos inclui o que se espera de um sedã grande, como bancos elétricos e com duas memórias para o motorista, ventilação para os dianteiros, carregamento sem fio para smartphones, piloto automático adaptativo, frenagem de emergência e head-up display com exibição da rota (inclusive do Google Maps).
Também tem câmera de ré e de visão lateral redundante à do retrovisor direito, mas a resolução delas decepciona. É preciso colocar tudo isso no papel e ponderar: esse Accord realmente vale os R$ 299.900 pedidos?
O Accord é o primeiro de três híbridos que a Honda terá no Brasil até 2023. O segundo deve ser o CR-V e o terceiro pode ser tanto o novo Civic híbrido (já em testes no exterior) quanto a nova geração do City – que você vai conferir na próxima edição – que já tem versão e:HEV.
Veredicto: o Accord surpreende pela eficiência e é um bom – e caro – cartão de visitas dos carros híbridos da Honda.
Teste – Honda Accord e:HEV 2022:
Aceleração
0 a 100 km/h: 7,7 s
0 a 1.000 m: 29,2 s – 176,6 km/h
Retomadas
D 40 a 80 km/h: 3,5 s
D 60 a 100 km/h: 3,4 s
D 80 a 120 km/h: 6 s
Frenagens
60/80/120 km/h a 0: 13/24/56,5 m
Consumo
Urbano: 17,5 km/l
Rodoviário: 17,2 km/l
Ruído interno
Neutro/RPM máx. 45,8/ 0 dBA
80/120 km/h: 62,9/66,9 dBA
Ficha técnica do Honda Accord e:HEV 2022:
Preço: R$ 299.900
Motores: 2.0 DOHC, i-VTEC, gasolina, dianteiro, transversal, 4 cilindros em linha; 145 cv a 6.000 rpm, 17,8 kgfm a 3.500 rpm. Elétrico, dianteiro, 184 cv, 32,1 kgfm
Câmbio: E-CVT com quatro níveis de intensidade de desaceleração, tração dianteira
Suspensão: McPherson (dianteira), multilink (traseira)
Direção: elétrica
Rodas e pneus: liga leve, 225/50R17
Dimensões: comprimento, 490,4 cm; largura, 186,2 cm; altura, 146,0 cm; entre-eixos, 283,0 cm; peso, 2.050 kg; tanque, 48,5 l; porta-malas, 574 l